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Significado e tradução de João 1:1

Escrito por  James White
Jesus no céu

Esta folha de informações está dividida em duas seções - a primeira explora o significado de João 1:1, e a segunda trata de um assunto mais técnico sobre a correta tradução do versículo. A segunda porção interessará àqueles que se depararam com a Tradução do Novo Mundo das Testemunhas de Jeová que está traduzindo a última cláusula deste verso como "a Palavra era um deus".

Seção I

No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez... E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade. Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse o revelou1.

O prólogo do Evangelho de João tem sido a muito tempo centro de controvérsias ao se discutir a Deidade de Cristo, e é natural. Alguém dificilmente leria as frases acima sem ter um vislumbre de Alguém que é muito além de um simples humano; até mesmo além do que anjos. O Logos, o Verbo, era no começo, estava com Deus, e era Deus. O Verbo criou todas as coisas, e não há absolutamente nada na existêcia que o Verbo não criou. Lembre-se que os primeiros leitores do Evangelho de João não teriam lido ainda o versículo 14, e eles não teriam ainda o conhecimento pré-concebido que o Verbo é identificado com Cristo. Tente se esquecer deste conhecimento por um momento, e imagine que tipo de ser você imaginaria enquanto estivesse lendo sobre este Verbo. Dificilmente alguém imaginaria um Ser Superior, que não Deus.

Para entender o que João está dizendo, nós devemos investigar os próprios versículos e analisá-los cuidadosamente. Nós devemos ter em mente que estamos lendo apenas uma tradução do que João escreveu, e daí alguma menção deve ser feita da língua grega.

A primeira declaração de João é que "No princípio era o Verbo." Que princípio? Considerando todo o contexto do prólogo, muitos identificam este princípio como o mesmo princípio mencionado em Gênesis 1:1. Mas muitos vêem que a declaração do Apóstolo vai muito além disto.

O elemento chave para se entender isto, a primeira frase deste magnífico versículo, é a forma da palavra "era", que na linguagem grega que João estava escrevendo, é a palavra en (o "e" pronunciado como um longo a, como em "I ate the food"). É uma palavra sem tempo - ou seja, ela simplesmente aponta para a existência antes do tempo presente, sem fazer referência a um ponto de origem. Qualquer um pode retroceder o "princípio" tão quanto possa imaginar, e, de acordo com João, o Verbo ainda é. Daí, o Verbo é eterno, sem tempo. O Verbo não é uma criação que veio à existência no princípio, por que Ele preexistiu ao princípio.

João é muito cuidadoso em sua linguagem neste ponto. Durante esta seção, João cuidadosamente contrasta o Verbo, e todas as outras coisas. Ele assim o faz por consistentemente empregar en para o Logos, o Verbo, e por consistentemente empregar um verbo totalmente diferente em referência a todas as outras coisas. Este outro verbo é tornar-se (egeneto). É usado com João Batista no versículo 6, com o mundo no versículo 10, e os filhos de Deus no versículo 12. Somente no versículo 14 João usa "tornar-se" com o Verbo, e isto é quando o Verbo "se torna carne". Isto se refere a um ponto específico no tempo, a encarnação, e demonstra o uso intencional de verbos por parte de João.

João não está sozinho nisto. Jesus contrastou Abraão "se tornando" com sua própria existência eterna em Jo 8:58 da mesma forma. O Salmista contrastou a criação do mundo com a eternidade de Deus no Salmo 90:2 (LXX) usando os mesmos verbos encontrados em Jo 1:1 e 14. Dificilmente parece coincidência, não é?

Nós vimos que o Verbo é eterno. Muito tem sido dito sobre como João tomou o termo "Logos", o Verbo. Alguns dizem que pegou emprestado da filosofia grega, uma espécie de um artifício filosófico. Ninguém poderia dizer que João simplesmente deixou o Logos da mesma forma que ele o encontrou entre filósofos. Não, ele encheu o Logos de personalidade e identificou o Verbo não como alguma confusa, celeste essência que é o princípio guia de todas as coisas (como os gregos pensavam) , mas o eterno Filho de Deus, Aquele que entrou no tempo e na experiência humana como Jesus de Nazaré. O "Verbo" revela que Jesus é a mente de Deus, o pensamento de Deus, sua completa e viva revelação. Jesus não só veio a nós para nos dizer como é Deus - Ele nos mostrou. Ele é a revelação de Deus.

João não parou aqui, contudo. Ele não nos deixou simplesmente saber da eternidade do Verbo. E a próxima frase diz: "E o Verbo estava com Deus". De novo nós achamos o verbo "estava" [en] aparecendo, novamente apontando para a ausência de tempo do sujeito. O Verbo estava com Deus. A preposição que João usa aqui é bem reveladora. É a palavra grega pros. Ela significa estar em companhia de alguém2 ou estar cara-a-cara. Ela fala de comunião, interação, sociedade. "Pros com acusativo apresenta um plano de igualdade e intimidade, cara a cara com cada um."3

Esta frase, se pega completamente só, seria muito confusa, desde que João já tinha declarado a eternidade do Verbo. Agora ele claramente distingue o Verbo de Deus. Ele afirma que eles são distintos. "Deus" e o "Verbo" não são termos intercambiáveis. Então, João está falando então de dois "deuses"? Poderia mais de um Ser completamente ser eterno? João era um judeu monoteísta. Ele jamais acreditaria em mais de um Ser que pode ser chamado por direito de "Deus". Então como isto deve ser entendido?

Esta frase deve ser tomada juntamente com a que a prossegue. Lemos "e o Verbo era Deus". De novo, o eterno en. João evita confusão nos dizendo que o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Jesus, como nós conhecemos como o Verbo, não constitui tudo o que está incluído na divindade. Em outras palavras, João não está ensinando a antiga heresia conhecida como Sabelianismo, que ensinava que Jesus e o Pai e o Espírito são simplesmente três diferentes aspectos da mesma pessoa, por exemplo, Jesus é o Pai, o Pai é o Espírito, e assim continua. Ao contrário, João aqui declara a total divindade de Jesus, enquanto nos informa que ele não é o Pai, mas que eles ("Deus" e o "Verbo") eternamente coexistiram.

Esta última frase tem ficado sobre fogo cruzado através dos tempos. A correta tradução desta passagem é dada aqui, e qualquer um interessado nos aspectos técnicos do argumento, este está referido no Apêndice A. Basicamente, a passagem ensina que o Verbo, em sua essencial natureza, é Deus. João não chama o Verbo de "divino", como um grego politeísta diria. Ele não usa o adjetivo, theios, que descreveria natureza divina, ou um ser divino. Ao invés disto, ele usa theos, a mesma palavra que João usa consistentemente para o Pai, "o único Deus verdadeiro" (17:3). Ele usa o termo 3 vezes com Jesus no Evangelho, aqui, em 1:18 e em 20:28. Não pode-se duvidar que João jamais chamaria uma criatura de Deus. Sua educação e herança judaica proibia isto.

Então como compreender estas duas frases? Benjamin B. Warfield disse:

E o Verbo estava com Deus". A linguagem é abundante. Não é somente uma coexistência com Deus que é declarada, como dois seres um ao lado do outro, unidos em uma relação local, ou mesmo em uma concepção comum. O que é sugerido é uma ativa relação de ligação. A distinta personalidade do Verbo é então não obscuramente sugerida. Por toda a eternidade o Verbo tem estado com Deus como um companheiro: Ele que no princípio já "estava", "estava" também em comunião com Deus. Apesar dele ser assim, de certa forma, secundário junto com Deus, Ele no entanto não era um ser separado de Deus: "E o Verbo era" - ainda o eterno "era" - "Deus". Em certo sentido distinguível de Deus, Ele era também verdadeiramente em certo sentido idêntico a Deus. Porém há apenas um eterno Deus; este Deus eterno, o Verbo é; em qualquer sentido nós podemos distinguí-lo do Deus que ele estava "com". Ele não é outro além deste Deus, mas Ele mesmo é este Deus. O predicado "Deus" ocupa a posição de ênfase nesta grande declaração, e é assim colocada na frase para impressionar com o contraste com a frase "com Deus", para prevenir suposições inadequadas à natureza do Verbo extraídas mesmo momentaneamente daquela frase. João queria que nos déssemos conta que o que o Verbo estava em eternidade não era somente o companheiro eterno de Deus, mas sim Ele próprio4.

O Apóstolo Amado anda na corda bamba aqui. Pela simples omissão do artigo ("o", ou em grego, "ho") antes da palavra para Deus na última frase, João evita ensinar o Sabelianismo, enquanto colocando a palavra onde ela está na cláusula, ele refuta outra heresia, Arianismo, que nega a verdadeira Deidade do Senhor Jesus. Uma pessoa que aceita a inspiração das Escrituras não pode fazer nada senão tremer diante desta passagem.

João continua no verso dois para reiterar a eterna companhia do Pai e do Filho, tendo certeza que todos entenderão que "Ele", o Verbo, estava (aqui está ele de novo) no princípio pros ton theon, com Deus. Sua companhia e relação precede tudo, e é eterna.

Batendo na mesma tecla, João então evita que todos interpretem mal sua afirmação que Jesus é eternamente Deus escrevendo o versículo 3. "Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez." Ninguém poderia ser mais inclusivo que isto. Não existe simplesmente nada por aí que não tenha sido criada pelo Verbo. Ele criou tudo. Óbviamente, então, se alguém pode ser descrito como criando tudo, este alguém deve ser o Criador, e certamente não uma criação. O Verbo é o Criador. Todas as pessoas que lerem as palavras de João entenderiam que o Criador é Deus, não um ser inferior criado por Deus para fazer o serviço pra Ele. Por não qualificar sua declaração, João certificou que nós poderíamos corretamente entender sua intenção e seu ensino sobre Cristo, o Verbo. Ele é eternamente Deus, o Criador.

Seção II

En arche en ho logos, kai ho logos en pros ton theon, kai theos en ho logos.

Quase toda a controvérsia em torno de Jo 1:1 gira no fato de que theos da última frase kai theos en ho logos é anarto, ou seja, não tem artigo. Alguns vão além e declaram que a tradução correta, então, é "o Verbo era um deus", baseando-se no argumento da falta do artigo definido ho antes de theos. O que a falta do artigo indica? É necessário para o que João está dizendo?

Eu inicio com o mais referenciado erudito neste assunto, Dr. A. T. Robertson:

E o Verbo era Deus ( kai theos en ho logos ). Por exata e cuidadosa linguagem João negou o Sabelianismo por não dizer ho theos en ho logos. Isto significaria que tudo de Deus seria expresso em ho logos e os termos seriam intercambiáveis, cada um tendo o artigo. O sujeito é deixado claro pelo artigo (ho logos) e o predicado sem ele (theos) assim como em João 4:24 pneuma ho theos pode só significar "Deus é espírito", não "espírito é Deus". O mesmo em 1 João 4:16 ho theos agape estin que pode significar só "Deus é amor", não "amor é Deus", como um chamado cientista Cristão diria confusamente. Para o artigo com predicado veja Robertson, Gramática, pp. 767f. O mesmo em João 1:14 ho Logos sarx egeneto, "o Verbo se fez carne", não "a carne se fez o Verbo". Lutero argumentou que aqui João se desfez do Arianismo também por que o Logos era eternamente Deus, comunidade do Pai e do Filho, o que Orígenes chamou de a Eterna Geração do Filho (cada um necessário para o outro). Assim a Trindade vê a comunidade pessoal como igualdade5.

Como Robertson fez referência a sua volumosa Gramática na referência acima, eu vou incluí-la completamente:

A palavra com o artigo é então o sujeito, qualquer que seja a ordem. Então em Jo 1:1, theos an ho logos, o sujeito é perfeitamente claro. Cf. ho logos sarx egeneto (Jo 1:14). É verdade que ho theos an ho logos (termos intercambiáveis) seria Sabelianismo. Veja também ho theos agape estin (1 Jo.4:16). "Deus" e "Amor" não são termos mais intercambiáveis que "Deus" e "Logos" ou "Logos" e "carne". Cf. também hoi theristai angeloi eisin (Mt 13:39), ho logos ho sos alatheia estin (Jo 17:17), ho nomos hamartia ; (Ro 7:7). A falta do artigo aqui é proposital e essencial para a verdadeira idéia6.

Note que Robertson traduz a frase, "o Verbo era Deus". Seu argumento é somado bem na seguinte passagem:

Uma palavra deveria ser dita sobre o uso ou não uso do artigo em João 1:1, onde um caminho estreito é seguramente seguido pelo autor. "O Verbo era Deus". Se ambos Deus e Verbo fossem articular, eles seriam coexistentes e distribuídos igualmente, assim, intercambiáveis. Mas a personalidade separada do Logos é afirmada pela construção usada e o Sabelianismo é negado. Se Deus fosse articular e o Logos não-articular, a afirmação seria de que Deus era o Logos, mas não que o Logos era Deus. Como está, João declara que no estado pré-encarnado o Logos era Deus, apesar do Pai ser maior que o Filho (João 14:28). O Logos se tornou carne (1:14), e não o Pai. Mas o Logos encarnado era realmente "O Deus unigênito no seio do Pai" (1:18 texto correto)7.

Na luz dos comentários do Dr. Robertson, é realmente inacreditável que algúem pode referenciar a seção acima e tentar sugerir que Robertson sentiu que Jesus era menor que o Pai porque ele referenciou João 14:28. Uma rápida olhada por seus comentários em João 14:28 em Word Pictures in the New Testament, volume 5, página 256 refuta esta idéia.

Para recapitular, Robertson diz que 1) a tradução da frase theos en ho logos é "O Verbo era Deus". 2) Que o theos anarto é requerido para o significado. Se o artigo estivesse presente, isto ensinaria o Sabelianismo, pois assim theos e logos seriam termos intercambiáveis. 3) Que o artigo antes de logos serve para apontar o sujeito da frase.

H. E. Dana e Julius Mantey usam João 1:1 para ilustrar o uso de artigo para determinar o sujeito em uma sentença copulativa:

O artigo algumas vezes distingüe o sujeito do predicado em uma sentença copulativa. Em Xenophon's Anabasis , 1:4:6, emporion d' en to korion , e o lugar era um mercado, nós temos um caso paralelo ao que temos em João 1:1 , kai theos en ho logos, e a palavra era a deidade. O artigo aponta para o sujeito nestes exemplos. Nem o lugar era o único mercado, nem a palavra era Deus por completo, como significaria se theos também tivesse o artigo. Da forma que está, as outras pessoas da Trindade estão implícitas em theos8.

De novo, estes eruditos estão apontando o uso do artigo para mostrar o sujeito em contraste com o predicado de uma cláusula. Eles, como Robertson, apontam que desde que theos é anarto, isto mostra que ele não é substituível por logos e vice-versa.

Dr. Kenneth Wuest, por muito tempo professor de grego na Moody Bible Institute em Chicago, comentou sobre este verso:

O Verbo era Deus. Aqui, a palavra "Deus" está sem o artigo no original. Quando é usado desta forma, ele se refere à essência divina. Ênfase está sob a qualidade ou caráter. Assim, João nos ensina que o nosso Senhor é em essência Deus. Ele possui a mesma essência que Deus o Pai, é um com Ele em natureza e atributos. Jesus de Nazaré, o carpinteiro, o mestre, é verdadeiramente Deus9.

Wuest em seu Expanded Translation, traduz 1:1:

No princípio o Verbo estava existindo. E o Verbo estava em comunhão com Deus o Pai. E o Verbo era em Sua essência absolutamente Deus10.

Ali Wuest traz a idéia que o nome predicado anarto tem um efeito característico, e que isto se refere mais à natureza do sujeito da cláusula do que uma identificação do mesmo. Isto concorda com o que Robertson disse - que o logos não é tudo de Deus, e que você não pode dizer "O Deus era o Logos". O próprio contexto (kai ho logos en pros ton theon) demonstra isto completamente. Aqueles que declarariam que o Logos deve ser identificado com a totalidade de Deus (por exemplo, Jesus é o Pai e o Pai é Jesus - Sabelianismo) encontra um problema insuperável aqui.

É bom notar que o comentário de Vincent11 que aqui "João não está tentando mostrar quem é Deus, mas quem é o Verbo". O Logos é o personagem principal aqui. Então quando nós vemos que o Verbo era, quanto à sua natureza Deus, nós podemos entender exatamente como ele pode estar com Deus e ainda ser Deus.

Os comentários de F. F. Bruce desta passagem são valiosos:

A estrutura da terceira cláusula no verso 1, theos en ho logos, exige a tradução "O Verbo era Deus". Desde que logos tem um artigo diante dele, é marcado como sujeito. O fato de theos ser a primeira palavra depois da conjunção kai (e) mostra que a ênfase principal da cláusula está sob ele. Se theos tivesse assim como logos precedido de artigo o significado seria que o Verbo seria completamente idêntico a Deus, o que é impossível se o Verbo também estava "com Deus". O que quer se dizer é que o Verbo partilha da natureza e ser de Deus, ou (para usar um jargão moderno) era uma extensão da personalidade de Deus. A NEB parafraseia "O que Deus era, o Verbo era", traz o significado da cláusula com tanto sucesso quanto uma paráfrase pode... Então, quando céus e terra foram criados, havia o Verbo de Deus, já existindo na associação mais próxima com Deus e partilhando da essência de Deus. Não importa o quanto tentemos levar nossa imaginação para o passado, nós nunca poderíamos alcançar um ponto no qual nós poderíamos dizer do Verbo Divino, o que Ário disse: "Houve um tempo que ele não existiu"12.

Outra fonte erudita sobre este assunto é encontrado em Expositor's Greek Testament:

O Verbo é distinguível de Deus e ainda, Theos en ho logos, o Verbo era Deus, de natureza Divina; não "um Deus", o que para um ouvido judeu seria abominável; nem ainda idêntico com tudo que pode ser chamado de Deus, pois assim o artigo teria sido inserido...13.

Uma outra diferente abordagem é tomada por outro grupo de eruditos. Estes eruditos se referem ao que é chamado de regra de Colwell, batizada em homenagem a E. C. Colwell, que primeiro enunciou esta regra no Journal of Biblical Literature14 em 1933. A regra diz, "A falta de artigo não faz o predicado indefinido ou qualitativo quando ele precede o verbo; é indefinido nesta posição somente quando o contexto necessita disto. O contexto não faz tal necessidade no evangelho de João"15.Esta é a visão de Morris, Metzger, Griffith e outros. Apesar da regra de Colwell não ser sem exceções, é um guia valoroso. Pelo menos, é um bom guia para tradução neste caso. Estes eruditos que vêem este versículo sob esta luz não necessariamente em contradição com os outros já citados. Primeiro deveria ser notado que Robertson e Nicoll morreram antes do trabalho de Colwell, e seus comentários refletem isto. Então, ambas abordagens direcionam-se às mesmas conclusões - a passagem ensina a deidade de Jesus Cristo. Alguns eruditos vêem o theos anarto como enfatizando a natureza do Verbo, e todos concordam que não é apenas um tipo qualitativo de descrição, dizendo apenas que Cristo era "um tipo de Deus". Um trabalho de um autor mais recente (março de 1973) se baseia neste assunto também. Philip B. Harner fez um estudo extensivo de nomes predicados anartos que também foi publicado no Journal of Biblical Literature16. Sua pesquisa levou a um nova preparação para visão da regra de Colwell, é verdade. Também deveria ser notado que este artigo tem sido usado extensivamente por aqueles que negam a Deidade de Cristo e traduzem erroneamente a passagem. Suficiente neste ponto é uma referência do próprio artigo de Harner:

Em todos estes casos o leitor inglês poderia não entender exatamente o que João está tentando dizer. Talvez a cláusula deveria ser traduzida, "o Verbo tem a mesma natureza de Deus". Esta seria a forma de apresentar o pensamento de João, que é, como eu entendo, que ho logos, não menos que ho theos, tem a mesma natureza que theos17.

A fonte confiável, Kittel's Theological Dictionary of the New Testament, é bem direta em João 1:1:

Uma similar persuassão é comum nos escritos Joaninos, e a maior parte incontestável. Jo 1:1 fala do Pré-existente: kai theos en ho logos... A falta de artigo, que é gramaticalmente necessário em 1:1, é impressionante aqui, e nos lembra do uso Filônico. O Logos que se tornou carne e revelou o Deus invisível era um ser divino, Deus por natureza. O homem nascido cego tinha alguma noção disto quando, depois de sua cura, caiu de joelhos em adoração de fé diante de Cristo, que adereçou ele com o divino "Eu" (João 9:38f). A venda final é removida, contudo, quando o Senhor Ressurreto Se revela a Tomé e surpreso o discípulo exclama: ho kurios mou kai ho theos mou (Jo. 20:28). Em Jo 1:1 nós temos cristologia: Ele é Deus em si mesmo. Aqui nós temos a revelação de Cristo: Ele é Deus para os fiéis18.

Para resumir: a frase kai theos en ho logos é literalmente traduzida por "e o Verbo era Deus" (Robertson, Bruce). A razão que theos é anarto é tanto por que ele é o predicado nominativo (Robertson, Dana and Mantey) quanto é necessário pelo fato de que se tiver o artigo, ele seria intercambiável com logos, o que seria contextualmente impossível. (Robertson, Dana and Mantey, Bruce, Nicoll) A regra de Colwell também aparece neste ponto. Nós vimos que a maioria dos eruditos vê theos como indicando a natureza do Verbo, que é Deus em sua natureza. A forma nominal é aqui usada, não o adjetivo theios, que seria necessária para apenas classificar o Verbo como "divino".

Então, João 1:1 ensina que o Verbo é eterno (a forma imperfeita de eimi, en), que ele sempre esteve em comunhão com Deus (pros ton theon), então ele é um indivíduo e reconhecível como tal, e que, quanto à sua essencial natureza, é Deus. Qualquer coisa menos foge do ensino de João, e não é bíblico.

O que dizer de "um deus"?

Até 1950, uma seção extra lidando com a tradução de João 1:1 como "e o Verbo era um deus" não seria necessário. Ninguém ousaria publicar tal "tradução". Contudo, em 1950, a Watchtower Bible and Tract Society publicou sua própria tradução da Bíblia, The New World Translation of the Greek Scriptures. Esta versão traduz João 1:1 desta forma. Um número de apêndices apareceram na NWT tentando defender esta tradução, fazendo referência a vários dos mesmos eruditos que já foram mencionados. À parte do comentário do The Expositor's Greek Testament acima, o seguinte de F. F. Bruce resume a verdade muito bem:

Não há verdade mais triste no aprendizado do grego do que "um pequeno aprendizado é um grande perigo". Os usos dos artigos gregos, as funções das preposições gregas, e a fina distinção entre os tempos gregos são expostos em público com confiança às vezes por homens que acham considerável dificuldade em usar estas partes da fala exatamente em sua língua nativa19.

Uma nota de rodapé aparece depois do comentário deste artigo, e diz:

Aquelas pessoas que enfatizam que a verdadeira tradução da última cláusula de João 1:1 é "o Verbo era um deus", provam nada mais que através disto mantém sua ignorância da gramática grega20.

Esta tradução viola os seguintes princípios:

  • Monoteísmo na Bíblia - certamente não pode ser argumentado que João usaria a mesma palavra que ele sempre usa com o Verdadeiro Deus, theos, para um que é simplesmente "deificado" ou um "deus" menor. As Escrituras não ensinam que existe um grupo de seres intermediários que podem ser chamados de "deuses". Isto é gnosticismo.
  • Se alguém dogmaticamente declarar que qualquer substantivo anarto deve ser indefinido e ser traduzido com um artigo indefinido, ele deve ser capaz de fazer o mesmo com todas as outras 282 vezes que theos aparece sem artigo. Como exemplo do caos que criaria, tente traduzir o theos anarto de 2 Coríntios 5:19. Não há simplesmente autorização da linguagem para fazer isto.
  • Ela ignora a localização de theos na cláusula - ele vem primeiro, e é enfático.
  • Ela ignora um princípio básico de tradução: se você vai insistir em uma tradução, você deve estar preparado para defendê-la de tal forma a prover um caminho para o autor expressar a forma alternativa. Em outras palavras, se theos en ho logos é "um deus", como João diria "o Verbo era Deus"? Nós já vimos que se João tivesse empregado o artigo antes de theos, ele faria os termos theos e logos intercambiáveis, equivalente ao Sabelianismo.
  • A tradução retira a frase de seu contexto imediato, deixando ela sozinha e sem utilidade. Pode Ele que é eterno (primeira cláusula) e que sempre esteve com Deus (segunda cláusula), e que criou todas as coisas (verso 3) ser "um deus"?
  • Só por que um substantivo não é precedido pelo artigo não automaticamente justifica a inserção do artigo indefinido "um". Esta é uma simplificação grosseira dos fatos, uma prática infelizmente comum entre aqueles que não estão propriamente treinados na língua grega. Estou ciente que esta é uma acusação séria, contudo, os fatos revelam que a Watchtower Bible and Tract Society tem consistentemente recusado a dar os nomes dos seus tradutores da NWT, e daqueles que foram descobertos, nenhum tinha mais que 2 anos de grego e nenhum hebraico formal.

Outros poderiam ser adicionados, mas estes são suficientes. Obviamente não há suporte erudito para a tradução de "um deus", e há um argumento massivo contra ela. Não é uma tradução válida de qualquer forma21.

Fonte: http://vintage.aomin.org/JOHN1_1.html

Notas:

1. João 1:1-3, 14, 18

2. Walter Bauer, A Greek-English Lexicon of the New Testament e Other Early Christian Literature, 2a. edição editada por F. W. Gingrich and Frederick Danker, (Chicago: The University of Chicago Press, 1979) p. 719.

3. A. T. Robertson, Word Pictures in the New Testament, 6 vols., (Grand Rapids: Baker Book House, 1932), 5:4

4. Benjamin Breckenridge Warfield, The Person and Work of Christ, (Philadelphia: The Presbyterian and Reformed Publishing Company, 1950), página 53.

5. A. T. Robertson, Word Pictures in the New Testament, vol. 5, páginas 4-5.

6. A. T. Robertson, A Grammar of the Greek New Testament in the Light of Historical Research, (Nashville: Broadman Press, 1934) páginas 767-768.

7. A. T. Robertson, The Minister and His Greek New Testament, (Grand Rapids: Baker Book House, 1977) páginas 67-68.

8. H. E. Dana, Julius Mantey, A Manual Grammar of the Greek New Testament, (New York: The MacMillan Company, 1950) páginas 148-149.

9. Kenneth Wuest, Word Studies in the Greek New Testament, vol. 3, 'Golden Nuggets,' página 52.

10. Wuest, Word Studies, vol. 4, página 209.

11. M. R. Vincent, Word Studies in the New Testament, vol. 1, página 384.

12. F. F. Bruce, The Gospel of John, (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans, 1983), página 31.

13. W. Robertson Nicoll, ed., The Expositor's Greek Testament, 5 vols, (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Company, 1983), 1:684.

14. E. C. Colwell, "A Definite Rule for the Use of the Article in the Greek New Testament" (Journal of Biblical Literature, 1933) pages 12-21. Veja também discussão nas notas de rodapé, Leon Morris, The Gospel According to John, (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Company, 1971), p. 77.

15. Morris, The Gospel According to John, p. 77.

16. Philip B. Harner, "Qualitative Anarthrous Predicate Nouns Mark 15:39 and John 1:1" (Journal of Biblical Literature, March 1973), 92:75-87.

17. Harner, página 87.

18. Gerhard Kittel, and Gerhard Friedrich, Theological Dictionary of the New Testament, 10 vols. Traduzido por Geoffrey W. Bromiley (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Company, 1964) vol 3:105-106.

19. F. F. Bruce, The Books and the Parchments, (Old Tappan, New Jersey: Fleming H. Revell Company, 1963), páginas 60-61.

20. F. F. Bruce, The Books and the Parchments, (Old Tappan, New Jersey: Fleming H. Revell Company, 1963), página 60-61.

21. Esta informação foi disponível durante um julgamento feito na Escócia, Douglas Walsh v. The Right Honorable James Latham Clyde, M.P., P.C., etc., Escócia, 1954. Eu incluí isto para demonstrar a não-erudição, a abordagem não-fatua utilizada ao defender esta tradução errônea.

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